Documentos das autoridades penais salvadorenhas, revelados pelo site local El Faro, indicam trocas de favores |
O presidente de El Salvador, Nayib Bukele, negociou a redução de homicídios e apoio eleitoral para seu partido, Novas Ideias, nas eleições parlamentares de fevereiro de 2021, com a gangue MS-13 (Mara Salvatrucha 13).
A informação foi revelada pelo El Faro, site local especializado em jornalismo investigativo, na última quinta (3).
Os repórteres tiveram acesso a documentos da administração penitenciária de dois presídios de segurança máxima no país, um dos mais violentos do mundo.
Nos materiais aos quais El Faro teve acesso, há comprovação por escrito de que ocorreram dezenas de reuniões secretas entre as equipes de Bukele e líderes da “pandilla”, gíria local para gangue.
Em troca de benefícios dentro da cadeia para essas lideranças presas pelo país e seus apaniguados, a MS-13 negociou apoio eleitoral e diminuição no número de assassinatos.
Baixar os altíssimos índices de homicídios no país é promessa eleitoral antiga de Bukele. Coincidência ou não, as mortes no país caíram cerca de 50% desde que o atual presidente chegou ao poder, segundo dados locais.
Os benefícios concedidos aos líderes presos vão de venda de alimentos como pizzas e pupusas, salgado de milho onipresente na mesa salvadorenha, a promessas de suavizar as regras nos presídios de segurança máxima – se Bukele conseguisse maioria no Parlamento.
Graças aos entendimentos, as pandillas puderam até mesmo comercializar produtos da rede de fast food Pollo Campero, especializada em frango e popular entre os centro-americanos.
O governo também se comprometeu a transferir presos considerados inimigos e voltou atrás na decisão, amplamente divulgada, de misturar homens de diferentes gangues na mesma cela.
Os homens de Bukele enviavam para as negociações altos funcionários como Osiris Luna, diretor de centros penais e Carlos Marroquín, diretor de Gestão da Reconstrução do Tecido Social. Ambos eram acompanhados por homens encapuzados durante as reuniões.
Nos registros, há vasta evidência de “pandilleros”, assessores e servidores de alta patente que participaram dos encontros. Os registros foram assinados e selados pelas autoridades salvadorenhas.
As “pandillas” em El Salvador são consequência direta da guerra civil que devastou o pequeno país, na América Central, entre 1979 e 1992. Hoje, controlam bairros inteiros das cidades, a exemplo do tráfico no Brasil.
Os chefes desses grupos ordenam ações e chacinas de dentro dos presídios. Para manter o poder, abusam de atividades ilícitas, inclusive com braços nos Estados Unidos.
A MS-13, por exemplo, surgiu pelas mãos de salvadorenhos deportados da Califórnia e outros estados norte-americanos nos anos 1970 e 1980.